terça-feira, 15 de novembro de 2011

Cabeça






Célia Pires




Olha-se no espelho da alma. O que vê não o agrada.
Uma figura patética, deformada pelas vicissitudes da vida.
Quais pintores do destino teriam pintado para ele um quadro de cabeça pra baixo? Não se lembra de ter pousado para ser retratado com pasta grossa de ressentimentos fazendo com que existisse uma cabeça dentro de outra cabeça. Mas ele não era esse ser deformado, trágico e sombrio. As vozes dentro de sua cabeça dizem que não.
Pergunta-se que quem teria misturado as cores, borrado o verde da esperança e diluído o azul dos seus sonhos e ideal?Quem teria roubado de se as cores do mistério e da fantasia?
O que o teria levado a ser esse ser patético, medroso, lançado à solidão, à miséria humana? A uma vida sem pé nem cabeça?
Queria ser o ‘cabeça daquela situação. Queria ser pintado com cores suaves, reais. Sem dor de cabeça. Sem explosões de cores sombrias
Lembra-se de uma velha frase: sua cabeça , sua sentença.
Em desespero roga aos céus que as mãos dos pintores do destino o pintem sem utilizarem tintas ásperas que lhe arranham a tela da alma provocando dores, afastando, os afetos, os amores e que removam essa grossa casa que deforma seu ser.
Decidido a mudar o quadro de sua vida deixa-se pintar.Aos poucos sente o pincel, às vezes a espátula num vai e vem, fazendo e refazendo, desempastando, de forma suave, mas intensamente apaixonada.
Estranhamente vê que as cores utilizadas são as mesmas. Vai aprendendo que cada cor tem a sua importância.
Impressionado, vê tudo ganhar novo sentido.
De repente, quando decide novamente olhar no espelho da alma para agradecer aos pintores do destino, percebe as mãos carregadas de pincéis e espátulas; Seu sorriso brota cheio de genuína alegria.Havia montado o próprio quebra-cabeça .Não havia pintores do destino. Ele era o autor de sua história, o pintor de sua obra. O pintor de sua obra...






Obra de Marcelo Accarini



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